terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

DELEGADOS DESPIRAM ESCRIVÃ: MAIS UM RETRATO DE COMO O SISTEMA PENAL BRASILEIRO TRATA AS MULHERES

Em busca de provas no caso de escrivã lotada em uma Delegacia da Polícia Civil na Zona Sul de São Paulo que estava sendo investigada1, os delegados encarregados pelo caso decidiram ser essencial a realização de busca pessoal na suspeita, dada a posibilidade de ela ainda portar consigo o dinheiro empregado na atividade ilícita. A despeito da presença de pelo menos seis homens e duas mulheres no recinto em que ocorria a ação em comento, todos eles agentes policiais, os responsáveis pela diligência não dão ouvidos aos pedidos da escrivã - que inicialmente fala e, por fim, grita em vão - para ser revistada por e na presença de mulheres. Todo o ocorrido foi documentado em vídeo por outros policiais e veiculado recentemente pela imprensa2.

Desrespeitaram-se as leis que veiculam direitos e garantias fundamentais e alicerçam um Estado Democrático de Direito a fim de fazer valer o que? As leis desse mesmo Estado? É claro que os crimes, notadamente aqueles cometidos pelos próprios funcionários públicos, devem ser severamente punidos. Mas observando-se sempre as normas pelas quais tanto lutamos para evitar arbitrariedades e promover o respeito aos indivíduos.

O art. 249 do CPP não poderia ser mais claro: a busca em mulher será feita por outra mulher. A escrivã não se nega a ser revistada, desde que a busca seja feita por mulheres, como reza a lei processual. Não obstante, inicia-se uma verdadeira tortura! Ela é ameaçada de desobediência e desacato se continuar insistindo em ver respeitados seus direitos; é algemada mesmo sem oferecer resistência ou fundar receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia; é despida à força e deixada nua da cintura para baixo enquanto um delegado exibe quatro notas de cinquanta reais para a câmera e a moça fica ao chão, pedindo para subir as próprias calças. Tudo isso, como dito anteriormente, foi filmado pelos próprios policiais, os quais não pararam a gravação mesmo após os pedidos da escrivã para que a filmagem fosse interrompida, numa última tentativa frustrada de se preservar.

E essa parece ser a regra a ser observada quando o Brasil trata mulheres indiciadas, acusadas ou apenadas, pois, aumentando a lista de barbaridades perpetradas contra essa mulher em particular e contra as mulheres brasileiras de uma forma geral, a Corregedoria de Polícia Civil pediu o arquivamento do Inquérito que apurava as infrações cometidas no caso, tendo sido atendida pelo promotor e juiz do caso. Apenas após manifestações nos meios de comunicação o caso foi retomado3.

1. Reportagens veiculadas na internet mencionam tanto o crime de concussão quanto o de corrupção, mas nos minutos finais do vídeo que transmite as imagens dos abusos cometidos contra a escrivã, ora comemtados, ouve-se que ela portava notas “xerocopiadas”

2. http://www.youtube.com/watch?v=quw7H-NXJA8 (link do vídeo); http://www.band.com.br/jornaldaband/conteudo.asp?ID=100000401703 (link para reportagem da TV Bandeirantes)

3. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/879288-promotoria-investiga-caso-em-que-delegados-despiram-escriva.shtml

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Mulheres exigem fim de feminicídio na região
Karol Assunção
Jornalista da Adital
 
"Nem uma mais morta”. Esse era o desejo de Susana Chávez, poetisa e ativista social. Defensora dos direitos humanos no México, Susana foi, neste mês, vítima justamente do crime que lutava para pôr um ponto final: o feminicídio. Os recentes assassinatos da poetisa e de mais outras duas mulheres no México reforçaram a necessidade de acabar com a violência de gênero na América Latina e no Caribe.
Motivadas pelos assassinatos de Susana Chávez, de Marisela Escobedo, e de Rubi (filha de Marisela), feministas da região aumentaram ações pelo fim do feminicídio. Um comunicado da Rede de Saúde das Mulheres Latino-Americanas e do Caribe (RSMLAC) convida as organizações sociais a realizarem uma "ação permanente” pelo fim da violência machista.
Todos os dias, mulheres e meninas de várias partes do mundo são vítimas do sistema patriarcal. São assassinatos, agressões físicas e psicológicas, abusos sexuais, tráficos e humilhações somente pelo fato de serem mulheres. Os números não deixam dúvidas da gravidade do problema: de acordo com o Observatório Cidadão Nacional do Feminicídio, de janeiro de 2009 a junho de 2010, 1.728 meninas e mulheres foram assassinadas em 18 estados do México.
A realidade mexicana não é exceção na América Latina e no Caribe. Panamá, Guatemala, Argentina, El Salvador, Paraguai, Colômbia, República Dominicana e Bolívia são outros exemplos de países em que as cifras de feminicídios são preocupantes.
Para RSMLAC, vários são os fatores e os responsáveis pela continuidade do feminicídio na região: "Estados que omitem e descumprem seu dever de garantir a vida e os direitos humanos das mulheres consagrados; sistemas de justiça inoperantes e corruptos que falham reiteradamente em identificar, perseguir e castigar os culpados; além de uma sociedade inteira que tem permitido o uso e abuso do corpo da mulher, coisificando-a como mero objeto. Uma sociedade que, sobretudo, tem normalizado e naturalizado a existência da violência sexista como se fosse uma circunstância própria do fato de ser mulher”.
Por conta disso, a Rede demanda, entre outros pontos: proteção e reparação a vítimas e seus familiares, sanções para os culpados, e desnaturalização da violência contra a mulher. No comunicado, a RSMLAC convoca ainda a sociedade a enviar cartas aos presidentes/as dos países latino-americanos e caribenhos exigindo o compromisso em proteger a vida e os direitos de mulheres e meninas.
Ato
No último dia 10, Susana Chávez, poetisa e defensora dos direitos das mulheres foi assassinada no México. No mês anterior, a comunidade mexicana já havia perdido outra ativista: Marisela Escobedo e sua filha, Rubi. Os recentes assassinatos motivaram as feministas a realizarem um ato, no dia 17, pelo fim do feminicídio na região.
A ação, promovida por movimentos feministas da América Latina e do Caribe, reuniu ativistas e lutadores/as sociais em frente às embaixadas mexicanas de diversos países da região. Na Nicarágua, por exemplo, as manifestantes entregaram uma carta ao representante mexicano no país centro-americano com as principais demandas dos movimentos de mulheres.
Fonte: Publicado originalmente na página da Adital: notícias da América Latina e do caribe