Em busca de provas no caso de escrivã lotada em uma Delegacia da Polícia Civil na Zona Sul de São Paulo que estava sendo investigada1, os delegados encarregados pelo caso decidiram ser essencial a realização de busca pessoal na suspeita, dada a posibilidade de ela ainda portar consigo o dinheiro empregado na atividade ilícita. A despeito da presença de pelo menos seis homens e duas mulheres no recinto em que ocorria a ação em comento, todos eles agentes policiais, os responsáveis pela diligência não dão ouvidos aos pedidos da escrivã - que inicialmente fala e, por fim, grita em vão - para ser revistada por e na presença de mulheres. Todo o ocorrido foi documentado em vídeo por outros policiais e veiculado recentemente pela imprensa2.
Desrespeitaram-se as leis que veiculam direitos e garantias fundamentais e alicerçam um Estado Democrático de Direito a fim de fazer valer o que? As leis desse mesmo Estado? É claro que os crimes, notadamente aqueles cometidos pelos próprios funcionários públicos, devem ser severamente punidos. Mas observando-se sempre as normas pelas quais tanto lutamos para evitar arbitrariedades e promover o respeito aos indivíduos.
O art. 249 do CPP não poderia ser mais claro: a busca em mulher será feita por outra mulher. A escrivã não se nega a ser revistada, desde que a busca seja feita por mulheres, como reza a lei processual. Não obstante, inicia-se uma verdadeira tortura! Ela é ameaçada de desobediência e desacato se continuar insistindo em ver respeitados seus direitos; é algemada mesmo sem oferecer resistência ou fundar receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia; é despida à força e deixada nua da cintura para baixo enquanto um delegado exibe quatro notas de cinquanta reais para a câmera e a moça fica ao chão, pedindo para subir as próprias calças. Tudo isso, como dito anteriormente, foi filmado pelos próprios policiais, os quais não pararam a gravação mesmo após os pedidos da escrivã para que a filmagem fosse interrompida, numa última tentativa frustrada de se preservar.
E essa parece ser a regra a ser observada quando o Brasil trata mulheres indiciadas, acusadas ou apenadas, pois, aumentando a lista de barbaridades perpetradas contra essa mulher em particular e contra as mulheres brasileiras de uma forma geral, a Corregedoria de Polícia Civil pediu o arquivamento do Inquérito que apurava as infrações cometidas no caso, tendo sido atendida pelo promotor e juiz do caso. Apenas após manifestações nos meios de comunicação o caso foi retomado3.
1. Reportagens veiculadas na internet mencionam tanto o crime de concussão quanto o de corrupção, mas nos minutos finais do vídeo que transmite as imagens dos abusos cometidos contra a escrivã, ora comemtados, ouve-se que ela portava notas “xerocopiadas”
2. http://www.youtube.com/watch?v=quw7H-NXJA8 (link do vídeo); http://www.band.com.br/jornaldaband/conteudo.asp?ID=100000401703 (link para reportagem da TV Bandeirantes)
3. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/879288-promotoria-investiga-caso-em-que-delegados-despiram-escriva.shtml